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segunda-feira, julho 26, 2010

os dias e as memórias


Dia 25 - fui com minha menina a S. Silvestre, ali em Cardielos, Viana do Castelo, uma festa que junta dois santos, o S. Tiago, por ser seu dia, e o S. Silvestre para justificr a bênção aos animais e a venda dos alhos, juntando assim os patronos da evangelização e da lavoura. O dia esteve tórrido, mas lá se aguentou. O cabrito da comissão de festas esteve à altura e os nossos amigos, Castilho e esposa, foram bons anfitriões. Deu para distender a massa crítica e lembrar amigos comuns.

No mesmo dia, à hora em que o jantar se pode servir ou adiar, fomos a Esporões, também com festa a S. Tiago. Fomos com o intuito de cumprimentar e apreciar o Grupo de Parada de Gatim, dirigido pelo senhor Adelino Pinto, um homem que junta a sabedoria à estética de bem trajar as raparigas. Mas a surpresa foi aquele rapazito de 11 anos, o Fernando, a encarregar-se da concertina, como autêntico mestre de tocata. Um fulgor de tocador, de seriedade e de ternura, a da sua infânica e a da sua dedicação.


Já escrevi sobre este homem, hoje aposentado mas sempre a trabalhar em costura para casas comerciais, dentro dos parâmetros e das vivências da moda, uma dimensão que lhe garante o lastro estético para saber tratar os trajes tradicionais com arte. Com ele aprendi a profundidade cognitiva do verbo «aclar», que escrevo assim e que posso aproximar de «fazer com a perfeição absoluta que o tecido, o corte e a mão requerem».
Anda pelos setenta anos, orienta o grupo e ainda dança. Tem a paixão pela tradição, sobretudo dos pormenores, naquela fronteira em que os usos e costumes se assumem como valores estéticos e éticos.

Ontem, anteontem, hoje, amanhã, com aquela persistência afectiva que a saudade garante à memória, nos temos lembrado do ROGÉRIO BORRALHEIRO.

Aqui deixo esta fotografia desfocada de uma qualquer romaria a que íamos muitas vezes. A última foi precisamente uma festa em honra de Santiago, para a qual fomos requisitados enquanto «artistas» ou «animadores» ou simples «romeiros de peregrinação interior».

Estávamos ainda longe de nós próprios, sem fazer ideia de qualquer ponto de chegada, mas já com aquela pressa de não termos tempo. Depois da morte, o sentido dos pequenos gestos e dos pequenos passos está sempre a refazer-se, como se já estivesse inscrito em todo o lado e não se vira.

Tenho a saudade e levo-a
trocando-a por palavras comoventes
as mesmas que em meus olhos são a névoa
que os torna impacientes

O desafio agora é situar-te
na extensão do mar
de modo que uma gota seja a arte
mais leve de chegar

a essa ilha ou terra prometida
onde olhos e palavras
encontram realizadas
as rudes ilusões da nossa vida

terça-feira, julho 13, 2010

24º aniversário da Casa de Trás-os-Montes e Alto Douro em Braga

As duas obras seguintes de Flávio Monte, não obstante já terem sido editadas há algum tempo, constituem-se como temática cultural de forte raiz antropológica para conversarmos sobre a nossa realidade regional transmontana e ao mesmo tempo apreciarmos páginas de intenso e renovado valor literário. A surpresa deste novel escritor português, transmontano de duplo nascimento, Luís Costa como homem e Flávio Monte como autor, radica numa invenção narrativa que entretece as histórias das personagens na geografia da paisagem e na narratividade multissecular dos lugares, dos caminhos e dos monumentos e radica também numa criação poética de profundos recortes afectivos, absolutizadora do torrão natal e simbolicamente projectora de um modo de ser e de estar «barrosão» no imaginário social contemporâneo.


Trás-os-Montes e transmontanos vivem de fulgores que a literatura tem projectado, vivem de personagens que o meio tem promovido à categoria de embaixadores e representantes, vivem também de uma paisagem contrastiva com outras e que singulariza os discursos, mas vivem também de uma periferia política que ora os tem protegido, ora os tem desafiado. É neste contexto contemporâneo de maior capacitação do desenvolvimento e de maior sentimento de crise que vale a pena dialogar com um escritor que é, a partir aqui de Braga, uma referência de intervenção cívica.

O romance Flor de Burel é uma primeira obra e logo de fôlego. Trata-se da história de uma família contada por um dos filhos, o mais novo, que um dia, por decisão conjunta com suas irmãs, resolve ir de Braga a Chaves para anunciar a sua mãe, já idosa, a decisão que tomou de a receber em sua casa para tratar dela até ao fim dos seus dias. Na viagem de regresso a Braga, David, assim se chama o filho mais novo de Amélia, engenheiro de profissão, dá boleia a um passageiro que lhe vai contar uma história avassaladora: trata-se da própria história de Amélia, mas contada pela perspectiva do pai, entretanto já falecido devido a um acidente vascular cerebral. O pai de David, um viúvo ligado à construção civil, que já era pai de cinco filhos quando se apaixonou por Amélia, vai meter na sua história todo o peso da terra barrosã e das suas circunstâncias, bem como toda a tralha das manifestações culturais e festivas que estão anexadas ao património paisagístico, monumental, rural e urbano das terras entre Chaves e Montalegre. Chegamos ao fim da leitura conformados e enternecidos com a serenidade e a firmeza de tão grande amor entre Simão Ventura e Amélia e ficamos a pensar que este romance é ao fim e ao cabo uma narrativa épica sobre a família, construída nas condições mais difíceis por gente em desigualdade plena de recursos e de condições, mas que foi fiel a esse impulso inicial que se chama amor e que depois pela vida fora se transforma em dever e em missão. O narrador quer-nos fazer passar uma ideia de simbiose total entre as pessoas, a paisagem, as condições de vida e as circunstâncias da história, simbiose que se pode traduzir nas ideias de resistência e de adaptação às dificuldades e de superação das mesmas. A estrada sinuosa, nesta linha que vai de Braga a Chaves desviando para Montalegre, acaba por ser a figura metafórica em que as personagens se revêem, não só pela importância decisiva que estes centros urbanos cumprem desde o nascimento à educação e formação das pessoas, mas também por serem periféricos em relação a outros centros, Lisboa e o Porto, onde se cumprem os objectivos das tomadas de decisão. A flor de burel é feita de arame e de bocados desse tecido grosseiro que é o símbolo da resistência do corpo e o facto de ter sido oferecida à noiva por um moço de recados remete esta narrativa para esse imaginário literário da pureza da felicidade dos infelizes.

O Livro d’Água é a primeira obra poética do autor e cumpre também o desiderato de ser obra de fôlego. Na verdade, estamos perante um autêntico tratado de ética, um código moral concebido como água de rega e água de beber e outra água que limpa ou destrói consoante os acasos da vida e do mundo. Os valores fundam-se na relação do homem com as suas circunstâncias, em primeiro lugar as físicas, naturais ou de paisagem. O facto de as terras matriciais do poeta serem terras altas fundamenta desde logo a sua percepção de poeta como aquele que sobe ao alto ou céu para tomar a visibilidade do mundo e de si e desce ao baixo ou abismo para denunciar a estragação do mundo e de si.

Por ser gerado numa agricultura de subsistência, onde a pastorícia cumpre um papel determinante, o poeta transfigura-se em pastor e tomas as realidades da pastorícia, as poulas, as serras, as rezes, as vezeiras, os lameiros, as pedras e as fragas, como realidades primitivas balizadoras do sentido da vida: o que é são, o que é puro, o que é necessário, o que é fundamental, o que é honroso, o que é bem, decorre da experiência humana com estas realidades.

Por viver numa região onde o estado natural de espécies da fauna e da flora ainda se verifica e ocorre, desde cavalos selvagens a lugares inóspitos, desde fragas inacessíveis a flores imprevistas, o poeta considera este mesmo estado de ser indomado como a melhor imagem do homem incorrupto, isento da sujeição a donos ou refém de domesticações estratégicas.

As aves de rapina são tão inspiradoras da liberdade como as forças da natureza, os ventos, a chuva, as tempestades, os trovões, a neve. Por ter sido criado com condições de vida rudes, e por terem sido rudes e primitivas, em termos de produção, as suas roupas e o seu calçado, mas também os seu alimentos, o poeta valoriza as experiências difíceis de usufruto, como o andar descalço, o calçar socos que magoam, o viver longe dos grandes centros urbanos, o remendar de roupas, o pedir e emprestar bens de necessidade, o cultivar a horta, o comer o que a terra dá. Por causa da centralidade que o porco e a vaca e a ovelha têm na vida agrícola de cada casa ou família, o poeta confere o papel de objectos mediadores a esses animais, sacraliza-os, como sacraliza os seus produtos transformados, a carne, o fumeiro, sacraliza a relação difícil que o homem tem com os animais e considera o sofrimento natural que essa lida implica um espelho de alma: o sofrimento mudo que a terra impõe só pode ser superado pela ideia de que só o sofrimento resgata o homem e lhe confere estatuto social.

A própria tez que a pele ganha na paisagem é elevada à categoria de objecto estético ou marca de sensualidade e de sensibilidade. Com esta marca exterior vai contrastar a brancura do interior, elevada à condição de ideal de pureza e considerada objectivo de conquista na reprodução social. As coisas, como as árvores, as casas, as capelas, mas também as coisas como o pão, a farinha, são o alicerce fundador do conhecimento: os sabores, os cheiros, os toques, as vistas, constroem-se a partir das sensações iniciais com essas coisas e mantêm-se por força da persistência dessas mesmas coisas ao longo da vida: elas são a inspiração da verdade das relações humanas: a farinha não pode ser impura, o carvalho não pode ser provisório, a capela não pode ser fácil, logo as relações humanas também precisam de ser puras, leais, transparentes, persistentes, seguras, elaboradas.

O ter de ser assim precisa de encontrar a sua aceitação natural no querer ser assim e este precisa de ser sempre renovado por um voltar a ser assim, e a força do ser assim decorre do próprio ciclo natural que é nascer e morrer e renascer e que a sementeira das batatas e do pão inspiram quotidianamente, ou seja esta ideia da repetição, do eterno retorno, este saber singular que a terra é sempre terra da terra, ou esta comparação do trabalho da terra a um tear, vale como fundamento poético e ético. O ter de ser é o calo, o querer ser é o esforço, o voltar a ser é a filosofia de vida, e isto bebe na própria história do pão que chega à mesa.

Pelo meio, o poeta vai tecendo poeticamente umas narrativas de proveito e exemplo, como a das tentações do diabo, para concluir sobre o sentido da fidelidade, como a das andorinhas, como a da génese das águas, ambas para concluir sobre a migração das pessoas, como a da neve, para concluir sobre os limites da vida, como a da chuva para concluir sobre a ternura da casa, como a da Marianinha e a do aerograma, para concluir sobre a cidadania política, como a do pobre pedinte para concluir sobre a hipocrisia social, como a do Zé da Mana, para concluir sobre a tragédia pessoal .

Pelo meio ficam também os sentimentos pessoais, as representações íntimas, o erotismo dos indivíduos e do colectivo, os afectos, as paixões, as memórias, mas estes só são verbalizáveis com as mesmas palavras que verbalizam as experiências com a natureza, com os lugares, com os objectos, com as águas, com os fenómenos atmosféricos, com os animais, com os outros, a mãe, o pai, a mulher amada, essa outra metade com quem se quer partilhar os valores. É na verbalização da relação amorosa, desde a fase do enamoramento à fase da paixão consumada, que se percebe quanto o poeta vai beber à sua natureza os excessos do arrebatamento: é que a natureza, na fauna, na flora, na criação dos animais e na sua transformação, é continuadamente erotizante, desencadeia o cio, o desejo, impele a reprodução, e para tal mobiliza sabiamente todos os pretextos, as manhãs, as flores, as romarias, as noites, o primeiro dia do ano, as estrelas, os invernos, a aurora, o Natal.

As palavras são, de facto, as poldras do conhecimento.

segunda-feira, julho 05, 2010

Quanto mais dinheiro, pior educação!

Ele há cada uma que parecem duas!

Um homem vende outro homem por 11 milhões, faz um negócio do «caraças» e ainda diz mal do produto? Um homem vende uma maçã podre por 11 milhões e não tem consciência do que diz?

E há outro homem que compra a maçã podre por 11 milhões e não é filmado a rir-se?

Um homem faz um filho e esconde a mãe e não tem vergonha? Com quem aprendeu a moda? Com aquele pai que tem as filhas artistas e nunca se refere à mãe delas? Com aquelas mães que geram «produções» independentes?

Estes casos de má educação não poderiam ser «ligeiramente» corrigidos com o dinheiro envolvido? O dinheiro não tem mesmo nada, nada, a ver com a educação?

E o meu pai que toda a vida me disse que se mais tivesse melhor nos educaria a todos e somos 9?

O que vale é que há flores bonitas em lugares imprevistos!

quinta-feira, julho 01, 2010

No país dos megas!

(Esta foto e a anterior foram tiradas por meu irmão António, em Raiz do Monte, na casa de nossos pais. Ao fundo, vê-se o castanheiro onde levei a minha última lição de humildade!)

Agora vamos aos mega-assuntos do país:

1. Sobre a morte de Saramago também eu registo o lamento, envio os pêsames e faço minhas todas as palavras do mundo, as boas e as más, que ele mereceu-as todas, ora por uma razão, ora por outra, ora pelos livros, ora pelas intervenções orais. Do que li, gostei de ler, do que não li, umas vezes foi porque o interesse não despertou, outras foi porque não vi matéria que me ilustrasse e desisti de continuar a ler. De quanto Saramago escreveu, digo: ainda bem que se pode comentar, criticar, discordar, compreender e aprender. Os autores não morrem nos cemitérios.

2. Dos resultados da nossa selecção no Mundial, farei a catarse sobre o rosto do treinador: nem cuspirei, nem rasgarei, o tempo apagará! Da minha infância, nos jogos de mudar aos cinco e acabar aos dez, estive de todos os lados, perdi, ganhei, fiquei de fora, saí sem jogar. Fico a aguardar que o meu colega Agostinho Oliveira chegue à ribalta: tenho fé!

3. Do ME e do Governo: perdi o respeito!

4. Das scuts: pago semanalmente as portagens Braga-Vila Pouca de Aguiar-Braga. Calo-me para não insultar quem manda, nem quem quer mandar neste país!

5. Da PT: entre o totalitarismo do mercado e o totalitarismo do estado, prefiro o primeiro.